Figuras típicas do passado – O Voz de Londres

Como o foi este Ernesto Sousa, um solteirão natural da Aguincheira – Castelões. Muito culto, vivia com sua mãe “Marquinhas do Capa Gatos”, mas era mais conhecido no nosso meio, pelo “VOZ DE LONDRES”.

Frequentava principalmente todos aqueles locais, onde ele, sabia que ali existia bons vinhos verdes tintos que era, sem qualquer dúvida, a sua paixão e de preferência adorava bebê-lo em malgas de barro ou de pó de pedra e sempre que ele levava a vasilha aos lábios o seu dedo mindinho fazia o acompanhamento sempre “ hertíco”, dando seguimento pelo intervalo a umas das suas habituais graças que tão bem lhe ficava e divertiam altamente todos os presentes, que nunca se cansavam de o ouvir.

Partiu, mas deixou muitas histórias: que passo a citar algumas das que convivi e das quais, muitas das vezes, era obrigado a transportá-lo na minha motorizada até ao acesso da calçada à portuguesa que o levava ao seu habitar, depois de ter passado a ponte de madeira do rio da Aguincheira.

E tenho comigo em memória muitas das suas histórias, com os saudosos “Zé da Farmácia e António do Alceu”.

Éramos quase sempre os últimos à espera que o Café Avenida chegasse ao seu fecho e esta figura normalmente aparecia nessas horas e sabia que um de nós o transportava.

Nunca deixamos que ele fosse a pé e também era normal seguirmos os três com ele até à estrada e verificar se ele fazia o seu final percurso normal.

Uma dessas histórias passadas no Café Avenida:

O VOZ DE LONDRES, estava connosco e quando chegou a hora de irmos embora, há um dos presentes que pergunta para o senhor Leonel (dono do Café):
– O que se deve aqui?
Responde o senhor Leonel que está tudo pago, só falta pagar um café do Ernesto.

Rapidamente o Ernesto, dá dois passos  à rectaguarda  e responde:
– Alto aí, Leonel, existe aqui um grande equívoco! Se tu dizias que eu devia uns hectolitros de vinho, eu até aceitava, agora café é coisa que eu até não gasto!

Outra deste saudoso, também na saída do Café, eu o esperava para o transportar, na motorizada, mas ele antes de se sentar encostou-se ao poste das duas lâmpadas, junto ao estabelecimento do senhor Agostinho Cubal, e começa a vomitar.

Mas, naquele preciso momento, passa um gato e começa a miar.

Ele responde de pronto:
– Oh! Não me lembro de te ter comido!

Além destes apontamentos, que são históricos e marcaram gerações, e muito mais a quem com ele conviveu de perto, estes e outros factos da sua vida, também além de divertido também nos divertia, com uma voz de ouro, em fados e serenatas, que encantavam mesmo aqueles que não eram entendidos no assunto.

Hoje ao lembrar esta figura típica de terras de Cambra, é sinal de uma justa homenagem, porque se tratou de um ser humano culto, divertido, cómico e mostrava motivo aos tristes e tímidos que com ele conviviam, momentos de elevada satisfação e muitas nos emitia bons conselhos. 

Arlindo Gomes