O sonho
acesso do silêncio ao dilatado vento da palavra o direito da
sombra na luz de todas as cores
O sonho
doce caminho dos lábios perfumados de alheias maçãs a voz
que há-de voar quando se calarem as asas
O sonho
canção intemporal que dá razão à loucura a sede de todas as
fontes a água de toda a secura
O sonho
vento leve e sensual tocado de algas e maresia adormecido o
pensamento na doce cama da fantasia
O sonho
uma flor a sorrir no outro lado do rio onde as quebras do
silêncio dão voz ao melro vadio
O sonho
os barcos que chegam tarde carregados de vinho amargo a
esperança de todo o tempo sem outro tempo de esperar
O sonho
mar derramado na areia fina beijando o corpo feito casa a
paz da tarde adormecida sem corpo para morar
O sonho
mão apertada ao escudo da liberdade ameaçada o sonho
tempo perdido tempo de sonho e de nada
O sonho
flor de orvalho colhida no seio efémero da madrugada o
silêncio da canção perdida no beijo da noite atraiçoada