A mais bonita de todas


A mais bonita de todas a mais bonita da festa a mais bela do
mundo
Uma estrela que caiu lá de cima e rolou por ali abaixo
percorrendo as ruas da cidade a luzir e a cantar de uma
forma quase imaterial quase sonhada quase santificada
Há muito que a beleza não me enchia de tanta poesia há
muito que os olhos se não molhavam desta forma há muito
que eu não sabia dizer coisas assim com tanta verdade
Os rios correm para o mar mas tu és um rio que nasce no
mar e avanças sobre mim afogando-me nas tuas ondas
Parecendo às vezes um lago tranquilo de um qualquer
paraíso entras em mim como um tornado revolves tudo
até ao fim de mim mesmo e quando a tua força acalma
restituis-me sob a forma de um verso ou de um beijo a
minha própria identidade nua e crua
Os teus lábios são a força da vida a contemporaneidade da
existência a aniquilação da mentira universal que o homem
carrega aos ombros de geração em geração entre os esgares
da estupidez humana
O que nessa manhã eu ouvia não eram Kiries e Aleluias
mas a tua voz deliciosa a projecção da tua beleza vivente
e amante o ecoar da tua presença nos montes e vales da
existência
Não te deixes embrulhar em papel de seda ainda que
amanhecido de sol e anoitecido de estrelas para que te
ofereçam aqui e ali como prenda banal
Tu não és uma prenda e muito menos banal
Tu não és de se mostrar mas de se viver
Tu és uma mulher
Não posso deixar de to dizer por um lado porque não consigo
deixar de to dizer por outro lado porque ninguém sabe
dizer-to tão bem como eu e ainda porque eu sei que dizê-lo
a ti não é dizê-lo a qualquer pessoa que não tenha a volúpia
a paixão e a carência que dão a alma à vida e o sentido ao
existir
Nem a ciência nem a arte me dão a realização humana da
tua presença
Olhar-te é mais do que tudo na complexidade da vida ver-te
é tudo o que preciso para encher a alma
Tão simples como isso
No entanto sabes bem que não sou louco
Formalmente não me pertences mas antes não me pertenças
no sentido folclórico da vida e sejas minha como elemento
essencial da inquietação
Sei que morro por dentro a pior das mortes se não te abraçar
se não te apertar contra o peito
Mas por dentro tenho eu morrido lentamente toda a minha
vida e vou morrendo todos os dias
Penso que o mesmo se passa contigo somos singularmente
iguais na forma de ser
Mas não te deixes morrer pois são tão raras as vidas
Não te deixes secar pois são tão raros os cactos intumescidos
Não te deixes apagar pois são tão raros os vulcões
Tu és um rio impetuoso tu és um ventre de fogo tu és uma
presença de início de mundo um pedacinho de céu caído do
firmamento e que anda por aí tropeçando nos caminhos da
vida onde ninguém sabe o que é um pedacinho de céu
Só eu sei
Por isso te quero por isso te reclamo como criação da
natureza pintada por mãos e tintas que a vida banal e vulgar
desconhece