Dr. Rufino Ribeiro – Uma boa polémica

Não há nada como uma boa polémica!

Dr. Rufino Ribeiro – Uma boa polémica

O Valecambrense Dr. Rufino Ribeiro arrasou um trabalho científico sobre a cegueira de Camilo Castelo Branco, com uma finura e estilo de admirar.

Deixemos ser ele a contar a história que se transformou em livro (aqui ou ali, pode dar jeito um dicionário).

Dr. Rufino Ribeiro – Uma boa polémica

O Dr. Gomes da Costa, Filho, médico em Poços de Caldas, no Brasil, proferiu uma conferência no consultório pomposamente rotulado de Centro de Estudos Crânio-Faciais do Instituto do seu próprio nome em que seguiu, pari passu, (isto é, copiou!) um capítulo de Camilo e os Médicos, da autoria do professor da Faculdade de Medicina do Porto, Dr. Maximiano Lemos.

Juntou à dissertação, apenas, da sua lavra, umas levezas originais, e publicou-a, mais tarde, com o promitente titulo Porque cegou Camilo?…

Na cauda do folheto, à laia de bibliografia, pranta trinta e seis títulos de livros para dar aos leitores uma ideia, pálida, muito pálida, das suas lucubrações, de trinta e cinco longos anos, à cata da moléstia.

Lembrando-se dos folguedos do filósofo e da explicação justificadora com a experiência do arco tenso que era preciso afrontar de vez em quando, para que não quebrasse – o Dr. Gomes da Costa, Filho, nesses trinta e seis volumes incluiu, à sorrelfa, quinze destinados a recrear o seu espírito e não leu, prudentemente, dois deles, não fossem as suas memórias dele estoirar, levando as Ciências e as Belas-Letras e Belas Artes ao descalabro.

Revelado o decalque na Cegueira de Camilo e a Miopia do Médico, o snr. dr., que a si mesmo havia outorgado a concessão de espiolhar a doença de olhos do Mestre de Seide, arqueja e pipoca ânsias de fúria.

À semelhança do mostrengo de Fernando Pessoa – não no do mar mas encovilado nas cafurnas sulfurosas do Centro de Estudos Crânio-Faciais, que não desvenda – vai chiando e perguntando:

Quem vem poder o que só eu posso?

À falta de melhor informador, dirige-se a uma sua empregada no consultório de um médico do Porto, para saber quem seria um tal senhor Ribeiro que assim pretendia ultrapassar os umbrais camilianos.

Lé com lé e cré com cré.

A bem informada amiga do Porto, jamais tinha ouvido falar de tal Ribeiro, um falhado, portanto, que vai pagar, com língua de palmo o ousio de querer poder o que só S. Ex. pode.

Com mais vinte anos de vigílias em porfiados estudos obviamente, mais dilatada bagagem camiliana e científica que os idos de 50, quando parturejou distocicamente o Porque cegou Camilo?…, sai agora do calamus do snr. dr. um facundo brotinho, esgalho do primeiro pelo seu blasonante estilo, veredas sintácticas e opados raciocínios clínicos. Enfim, um folheto, um folhetão!

A cegueira de Camilo e a obliquidade do snr. Ribeiro – O Brotinho II – é obra tirada das canelas e de cachimónia portentosa. Lá isso é!

O Brotinho I – Porque cegou Camilo?… sem as pompas literárias e científicas adquiridas durante as duas últimas décadas, havia sido dado à luz antes das luas contadas. Um prematuro de gâmbias moles. Amelado, linfático, informe.

De lamentar apenas que no saburroso rebento, obrado à força de óleo de mamona, o dr. Gomes da Costa, Filho, não se defenda da acusação feita na Cegueira de Camilo e a Miopia de um Médico – de haver decalcado no Porque cegou Camilo?… um capítulo inteiro, e algo mais, de Camilo e os Médicos, de Maximiano Lemos.

Para o dr. Gomes da Costa, Filho, isso não conta. Enconcha-se.

O Ribeiro, usurpado do seu título académico pelo Dr. Gomes da Costa, Filho, no seu Brotinho II, e sem o recurso do vocábulo de viela de que o snr. dr. tanto usa no seu folheto, no seu folhetāo, vai responder-lhe à letra – ridendo…

Ridendo castigat … Costa Filius… assim escreve o snr. Ribeiro, é o título da segunda parte da Cegueira de Camilo e a Miopia de um Médico integrado nas notas da 1. edição.

Se o snr. dr. ali se vir retratado e não gostar de remirar-se no retrato que de si próprio fez, é lá consigo. Quem não quer ser lobo não lhe veste a pele.

Pelo facto da 1. edição da Cegueira de Camilo e a Miopia de um médico se haver esgotado; pelo desejo de eliminar as gralhas do livro; e, sobretudo, para demonstrar que o dr. Gomes da Costa, Filho, ainda sofre mais de miopia do que à primeira vista parece, justifica-se esta nova edição.

Solicita-se ao leitor a bondade de integrar as notas no próprio texto para a sua mais fácil compreensão.

Vila Nova de Gaia, 13 de Junho de 1972