por Irene Tavares Dias
A lenda do Calhau do Dinheiro remonta à época Megalítica, ou seja, à idade da pedra, aquando da invasão da Península pelos vários povos, Mouros, Gregos, Celtas, Cartagineses, Romanos, Visigodos, povos que viviam da pesca e caça e faziam guerras entre si, para se apoderarem da terra.
Daí os Mouros terem edificado os chamados Crastos ou Castro.
Havendo entre nós o chamado Crasto do Chão do Carvalho que fica no Monte sobranceiro às aldeias vizinhas e no ponto mais alto, onde se pode avistar todas as terras circunvizinhas, como Junqueira e Cabrum.
Diz a lenda que os Mouros arremessavam um martelo à chamada Rocha da cabeça que fica em frente ao monte de Cabrum, o que nos permite perceber que já existia a povoação com o mesmo nome.
Vou transcrever aqui esta lenda em verso, escrita pelo meu pai Adão Tavares a quem apelidaram de poeta Serrano.
Escondido nas serranias,
hoje encobertos por pastos,
há em várias freguesias
vestígios dos chamados Crastos.
Eram cercos bem murados
e em altos miradouros.
Dentro deles habitados
por Celtas, Gregos e Mouros.
Povos que viviam da guerra,
do comércio, da pesca e caça
e também na nossa terra,
eles deixaram sua raça.
Diz-se serem homens possantes
e de pequena estatura,
tinham força de gigantes,
a sua vida era dura.
Travavam lutas sangrentas,
movidos pela ambição
e com suas ferramentas
enterravam a riqueza no chão.
Removiam enormes penedos
e neles deixavam sinais
temiam, nos seus medos,
que não voltariam mais.
Na pedra ficou gravado,
em riscos, o signo-saimão,
a patada de um cavalo,
ou o rabo de um sardão.
São estas iniciais marcadas
que atravessaram gerações
e a elas estão ligadas
“encantes” e superstições.
É a lenda mais antiga,
merece o lugar primeiro.
Por todos mais conhecida,
“A lenda do calhau do dinheiro”.
Fica no monte sobranceiro
ao lugar do Chão do Carvalho,
por ter fama de dinheiro,
é que deu tanto trabalho.
Este penedo gigante
guarda grande tesouro.
Ninguém lhe tira o “encante”
que esconde grades em ouro.
Diz a lenda que se ouvia
a horas mortas da noite
e toda a gente temia,
mesmo o homem mais afoite.
Rumores de almas penadas
assombravam a região.
Ténues luzes azuladas
andavam suspensas do chão.
As almas nele encantadas
que lhe serviam de vigia
tinham que ser responsadas
para acabar sua agonia.
Já em tempos recuados
conta a história que, um dia,
sete homens arrojados
e o pároco da freguesia
e desenharam no chão
para ninguém lhe fazer mal
um grande signo-saimão.
Mas havia um seu vizinho,
nada trouxa por sinal,
era meio adivinho
e dirigiu-se ao local.
Estava o grupo formado,
instalou-se a confusão.
O que não foi convidado
ficou fora do signo-saimão.
O padre fez-se acompanhar
de missal estola e batina
e começou a rezar
como mandava a doutrina.
Expulsar o demónio mau
que a região assombrava
deixar livre o Calhau
que tal tesouro guardava.
Era feito um pedido
por essa Moura encantada,
só a troco de um ser vivo
é que a fortuna era dada.
A dada altura se ouviu
um enorme trovão
uma voz grave pediu:
– Que me dais para ter a riqueza à mão?
Um dos homens respondeu,
sem nenhuma hesitação:
– Damos-te aquele que entre nós
está fora do signo-saimão.
O cabeço abre-se, por instantes,
vendo-se machados e grades de ouro.
Ficaram todos radiantes
ao ver tamanho tesouro.
Um remoinho se formou
e o homem foi apanhado.
E quando tudo olhou,
no ar tinha levantado.
Credo, Santo nome de Jesus!
Palavras que o homem proferiu.
E feito o sinal da cruz,
no meio do mato caiu.
De repente, fechou-se o penedo,
os homens ficaram pasmados
e regressaram com medo
e todos desanimados.
E a riqueza ali ficou
nesse calhau encantado.
E a lenda continuou,
ninguém lhe quebrou o fado.
Adão Tavares, Pai de Irene Tavares Dias
Do livro Origens, Poemas e Lendas