Declaração – II

Declaração – II

Por vezes as cartas afectuosas que os incultos retêm, criadas pela sua garra poética e rendilhadas com o que o coração sabe ditar, revelam bem o amor que une e atrai os namorados.

Declaração – II

Às vezes ponho-me a cismar
Nos teus cabelos doirados,
Tão finos, tão bem frizados,
Com mais brilho que o luar.

Ponho-m’eu a meditar
Nas perfeições que te vi,
Meu rosto alegre sorri,
Esperando ter melhor sorte.

Eu queria antes a morte
Entregar-me todo a ti;
Das tuas mãos recebi
Uma carta dedicada
Eu seria tua amada
Se estivesse ao pé de ti.
Eu abri e nela vi
Quanto por mim sofrestes
E o que no mundo padecestes
Por minha causa jovem donzela querida;
Ainda está escondida
A carta que me mandastes.
A carta que me mandaste
Tenho no peito guardada;
Com o suor do meu peito,
Tem a tinta desbotada.

Eu nem digo, ó meu pai,
Que são falas escusadas;
Eu sou menina e moça:
Não sirvo pra remir casas.

Outras toalhas mais finas
São guardanapos de mesa,
Essa tua opinião
Inda há-de dar em baixeza.

-§-

Se disso faz grande gosto,
Tomai-o por vida vossa,
Que esta rosa que aqui vedes,
Ela é doutro, não é vossa.
Se é doutro, não é vossa…
Minha poderá vir a ser;
Menina diga a seu pai
Que nos manda arreceber.
Outras mais novas que si
Remi casa e tem marido
Assim será vós, menina,
Quando casar comigo.

A licença vós a tendes
Mas por ora inda não;
Não há-de ser o mancebo
Que me há-de pôr a mão.

Eu nem vos ponho a mão
Nem também bulo convosco
Só o estar ao pé de vós
Disso faço grande gosto.